quinta-feira, 9 de agosto de 2012

ATEISMO E RELIGIÃO

Sebastiao Borba sebastiaoborba1@yahoo.com.br
3 ago (6 dias atrás)

para mim
13 Ateísmo e Religião 
Qual é a relação entre a religião e o ateísmo? É o próprio ateísmo uma religião? Poderá haver 
religiões ateias? É o ateísmo necessariamente uma posição anti-religiosa? 
Neste capítulo, argumento que o ateísmo em si não é uma religião. Contudo, sustento 
que há três religiões mundiais — jainismo, budismo e confucionismo — que são ateístas numa 
das acepções primárias do termo tal como o definimos na introdução geral deste volume: a 
negação da existência de um Deus teísta. Mostro também que numa acepção importante o 
ateísmo nem sequer se opõe às religiões teístas.  
O conceito de religião 
Historicamente, o conceito de religião foi desenvolvido no contexto judaico-cristão e tem 
ainda a sua aplicação mais clara neste contexto. Tal como o conceito de ateísmo aplicado 
fora do seu contexto histórico original pode ser enganador, também o conceito de religião o 
pode ser se for aplicado fora do seu contexto original. Contudo, assumir-se-á aqui que uma 
aplicação cautelosa fora do seu contexto histórico mais claro pode também ser iluminante, 
pelo ateísmo é uma religião, e se há religiões ateias, é preciso considerar uma pergunta anterior: o 
que significa dizer que algo é uma religião? É impossível discutir aqui as tentativas principais 
de definir religião na filosofia, estudos religiosos, e ciências sociais. Dado que a minha forma-
ção e experiência é filosófica, considero duas das melhores análises recentes do conceito de 
religião que se encontram na bibliografia filosófica. 
William Alston aborda o conceito de religião especificando aquilo a que chama características “constitutivas da religião”.
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 São as seguintes: 
1) Crença em seres sobrenaturais. 
2) Uma distinção entre objectos sagrados e profanos. 
3) Actos rituais centrados em objectos sagrados. 
4) Um código moral que se crê ser sancionado pelos deuses. 
5) Sentimentos caracteristicamente religiosos (temor, sentimento de mistério, sentimento de 
culpa, adoração) que tendem a ser activados na presença de objectos sagrados e durante a 
prática ritual, e que estão conectados mentalmente aos deusesmenos para leitores ocidentais. Para responder às perguntas distintas de saber se o 6) Orações e outras formas de comunicação com os deuses. 
7) Uma mundividência ou imagem geral do mundo como um todo e do lugar do indivíduo no 
seu seio. Esta imagem inclui uma especificação de um propósito ou fim geral do mundo e 
uma indicação de como o indivíduo nele se insere. 
8) Uma organização mais ou menos total da vida do crente com base na mundividência. 
9) Um grupo social ligado pelas características anteriores.  157
De acordo com Alston, estas características “nem isoladamente nem em coDe acordo com Alston, estas características “nem isoladamente nem em combinação 
constituem condições necessárias e suficientes rigorosas para que algo seja uma religião.”
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Contudo, afirma, “cada uma delas contribui para constituir algo como uma religião”. E continua: “Quando um número suficiente destas características está presente num grau suficiente, 
temos uma religião.”
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 Alston argumenta que não há uma maneira mais precisa do que esta de 
dizer o que é uma religião. 
Para Alston, o catolicismo romano e judaísmo ortodoxo são casos paradigmáticos de 
religiões; constituem o género de casos a que o termo “religião” se aplica com a maior certeza e inequivocamente. Contudo, argumenta que “pode haver uma diversidade de casos que 
difiram do paradigma de diferentes maneiras e em graus diferentes, desaparecendo uma ou 
outra das características constitutivas da religião num maior ou menor grau.” O ritual desaparece inteiramente nos Quakers e o protestantismo dá-lhe menos ênfase; a crença em seres 
sobrenaturais “é desbastada até nada restar em certas formas de unitarismo, ou pode nunca 
estar presente, como em certas formas de budismo.”
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À medida que mais características religiosas desaparecem parcial ou completamente, 
sustenta Alston, “sentimos maior relutância em aplicar o termo “religião”.” Na verdade, 
“encontramos cada vez menos casos óbvios de religião à medida que passamos, por exemplo, 
do catolicismo romano para o comunismo, passando pelo unitarismo, humanismo e budismo 
hinaiana.”
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 O melhor que podemos fazer, segundo Alston, é especificar as características dos 
casos paradigmáticos e depois especificar os aspectos em que os casos menos claros diferem 
dos paradigmas. 
Esta proposta de análise do conceito é salutar na medida em que é muito difícil tentar 
especificar, em termos de um conjunto de condições necessárias e suficientes, a essência de 
fenómenos complexos e diversificados como a religião. A abordagem de Alston de apresentar 
características constitutivas da religião permite-nos incluir sob a rubrica da religião tudo o 
que queremos incluir e permite-nos comparar casos menos claros com casos paradigmáticos. 
Contudo, há um problema com a abordagem de Alston. É importante notar que quatro A referência a deus 
entra também na explicação de Alston de algumas das outras características. Por exemplo, os 
objectos sagrados são explicados em parte por Alston como objectos que são “a morada ou 
manifestação de um deus.” Assim, dado o facto de o ateísmo rejeitar deuses, não poderia 
haver casos claros ou paradigmáticos de religião ateia. Contudo, dado que o budismo é considerado um caso paradigmático de religião e dado que o budismo é ateu, pode-se muito bem 
pôr em causa a neutralidade dos critérios de Alston. 
Monroe Beardsley e Elizabeth Beardsley tentaram também definir o conceito de religião.
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 Diferentemente de Alston, sustentam que os conjuntos de crenças, emoções e acções a 
que se chama “religiões” incluem não apenas religiões bem conhecidas, como o cristianismo, 
o judaísmo, o islamismo, o hinduísmo, o budismo, o taoismo e o xintoísmo, mas também religiões antigas e as religiões de sociedades iletradas. Argumentando que não se pode definir 
“religião” em termos de uma crença em deus ou numa alma porque estas crenças não se
das nove características mencionam explicitamente um deus ou deuses. É o ateísmo uma religião? 
Em 1971, a ateia proeminente Madelyn Murray O’Hair
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 argumentou que o ateísmo não era a 
religião do futuro porque os ateus, apesar de serem muitos, não estavam organizados, eram 
complacentes e não estavam decididos a lutar contra a usurpação jurídica e política do cristianismo nos Estados Unidos. O cristianismo estava a ganhar cada vez mais poder político, 
afirmou, e os ateus nada faziam para o impedir. 
Uma leitura ingénua do discurso de O’Hair pode muito bem levar-nos a pensar que ela 
acreditava que se os ateus fizessem o que ela aconselhava, o ateísmo seria a religião do futuro, mas não é claro até que ponto se deve levar o seu discurso a sério. Fossem quais fossem as 
suas intenções, pode-se dizer com segurança que o ateísmo não é a religião do passado, do 
presente ou do futuro porque não é de modo algum uma religião. 
Usando qualquer uma das definições acima, o ateísmo não obedece às condições para 
ser uma religião. O ateísmo negativo — ou seja, não ter uma crença em Deus ou em deuses — 
não tem qualquer uma das características constitutivas da religião especificadas por Alston, e 
não fornece respostas a qualquer uma das perguntas religiosas básicas especificadas por 
Beardsley e Beardsley; nem sequer à pergunta 2: Quais são as características da realidade 
inumana mais significativas para a vida humana? O ateísmo positivo — a crença de que não há 
Deus nem deuses — não é também uma religião, de acordo com as nossas duas definições de 
religião. Não tem qualquer das características constitutivas da religião especificadas por Alston; na verdade, implica a negação das que mencionam um deus ou deuses. E a única pergunta religiosa básica de Beardsley e Beardsley a que remotamente se pode pensar que responde Haverá religiões ateias? 
Contudo, do facto de o ateísmo não ser em si uma religião não se segue que não haja religiões 
ateias. Alguns estudiosos da religião argumentaram que o jainismo, o budismo (em algumas 
das suas manifestações) e o confucionismo pertencem a esta categoria.
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 Não há dúvida de 
que são religiões. Reconhecidas como tais pelos estudiosos, obedecem aos requisitos da definição de Beardsley e Beardsley dado que fornecem respostas às cinco perguntas religiosasbásicas. Além disso, apesar de não serem casos paradigmáticos de religião segundo a perspectiva de Alston, têm certamente suficientes características constitutivas da religião para poderem contar entre os seus casos menos claros. Exactamente quantas características constitutivas da religião têm depende de a crença num deus ou deuses ser parte delas. Por isso a questão não é saber se o jainismo, budismo e confucionismo são religiões mas saber se são religiões ateias. Exploro já de seguida esta questão com respeito ao jainismo, budismo e confunismo





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